segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Direito Português no Brasil Colônia – 2ª parte.


            O sistema de Capitanias Hereditárias não funcionou por muito tempo. O empreendimento colonial não pode se manter apenas com o capital privado. Foram poucos os donatários que assumiram seus lotes, muitos deles enviaram ouvidores em seu lugar, a ocupação se deu de maneira muito dispersa e pouco lucrativa para a Coroa.

            A Coroa portuguesa resolveu transpor para a colônia o modelo de administração municipal da Metrópole, no sentido de ter maior controle das terras coloniais e buscar melhores resultados econômicos. Então, em 1548 foi criado o Governo-Geral e em 1549 foi implantado no Brasil, com sede em Salvador, sendo o primeiro Governador-Geral Tomé de Sousa, que veio acompanhado do Desembargador Pero Borges para desempenhar a função de Ouvidor-Mor. É o marco inicial da estruturação do judiciário brasileiro.

A diferença com relação ao sistema de capitanias é que os donatários, que antes possuíam poderes praticamente soberanos, estariam sujeitos, a partir de então, ao Governo-Geral; e os Governadores-gerais  estariam diretamente sujeitos ao poder metropolitano.

Contudo, o poder do governador era limitado por normas muito precisas e rigorosas, e devia prestar contas detalhadas, especialmente, ao fim do mandato. Havia uma fiscalização rotineira dos feitos do governo-geral, porque se vivia um contexto de desconfiança do governo central com relação aos seus agentes, em razão de desleixos, incapacidades e desonestidades entre eles; há de se levar em conta as distancias e as dificuldades de comunicação, que facilitavam toda sorte de desmandos.

Um Regimento estabelecia quais as competências do Governador-Geral; seriam: cuidar da defesa da terra contra ataques construindo e conservando fortes e muros, bem como, armando os colonos; favorecer o estabelecimento de engenhos de cana de açúcar; empreender expedições exploradoras; proteger os interesses da Coroa com relação ao pau-brasil e aos impostos; fazer aliança com os índios e auxiliar em sua catequese – o governador devia evitar a sua escravização, e doar terras aos índios com a intenção de os integrar no sistema produtivo colonial.

O índio era uma questão difícil a ser tratada pelo Governador, visto que os interesses e a visão de colonos e Coroa portuguesa entravam em conflito. Para os colonos o índio era mão de obra abundante e barata, para a Coroa os índios deveriam ser tratados como colaboradores na ocupação do território; mas, essa visão não se justificava pela intervenção papal em favor do índio em 1537, mas sim pelos interesses de Portugal no comércio lucrativo de escravos da África: a colônia era um consumidor em potencial do tráfico negreiro, que se desenvolvia e estaria liberado oficialmente para o Brasil em 1559. E para reforçar esse conflito entre interesses metropolitanos e colonos estavam os jesuítas a defender os índios e protege-los em suas missões, ou reduções, ou melhor, suas propriedades agrícolas, nas quais os índios seriam a mão-de-obra principal.

O Provedor-Mor da Fazenda (tributos e cargos), o Capitão-Mor da Costa (defesa) e o Ouvidor-Mor (Justiça) eram os principais auxiliares do Governador-Geral.

O Ouvidor-Mor exercia, na verdade, uma função jurídico-administrativa. Ele era a autoridade máxima da Justiça na colônia, mas, dependendo da personalidade do Governador-Geral e dos interesses em jogo, as atribuições do Ouvidor-Mor poderiam se confundir ou sobrepor. A princípio, o Ouvidor-Mor era independente, mas, depois, a função vinculou-se com a do Governador-Geral, exercendo as seguintes atribuições:

“examinar conflitos de jurisdição em grau de recurso de apelação ou agravo; limitar o excesso de jurisdição dos donatários, emitir alvarás para soltura dos culpados em crimes, para busca aos carcereiros, para fazerem fintas nas obras públicas dos Conselhos, para seguir apelação e agravo sem que houvesse embargo ou falta de preparo, para entrega de fazenda e ausentes, para possibilitar realizar prova de direito comum em contratos ou alvarás de fiança; vigiar, fiscalizar e punir os donatários que tenham agido por força ou extorsão pública ou criado obstáculos à atividade judiciária; guardar provisão da Mesa de consciência e Ordens sobre dinheiro de pessoas já falecidas, cativos e ausentes”. (CASTRO, Flávia Lages de. História do Direito. Geral e Brasil. RJ: Editora Lumen Juris, 2011. Pp.305-306).

Algumas atribuições, como anistiar ou castigar os réus, só cabiam ao Ouvidor-Mor, este poderia aplicar até a pena de morte em escravos, índios e peões cristãos livres; mas, no caso da pena máxima teria que despachar com o Governador, mas, se houvesse discordância entre eles, levariam o caso ao Corregedor da Corte. Nas pessoas de “maior qualidade” poderia aplicar até cinco anos de degredo, excluindo-se de sua ação as pessoas eclesiásticas.

Formalmente, estavam assim organizados, mas, na prática, topavam com muitas dificuldades. Portugal cometeu o erro de transpor o modelo de administração da Metrópole para o Brasil tal e qual, apenas com relação aos impostos houve uma adequação. Não levaram em conta o tamanho do território e as dificuldades de comunicação. Centralizaram e concentraram o poder e as autoridades em capitais e sedes, enquanto o resto do território ficava praticamente desgovernado, no melhor dos casos, a Justiça estava à mercê da incompetência de leigos como eram os juízes ordinários.

As vilas possuíam uma série de cargos jurídicos: almotacéis, juiz ordinários, etc, mas de uma jurisdição imensa. Para amenizar a dificuldade em dar conta de todo o território, a administração portuguesa realizava a prática das Correições e das Visitações, que eram excursões administrativas que deveriam atingir todos os recantos da jurisdição. Estas visitações aconteciam raramente e, geralmente, tinham como objetivos fiscalizar, supervisionar ou auditar recursos. Os ocupantes desses cargos jurídicos também não se limitavam a questões de Justiça, mas assumiam também funções administrativas.

A estrutura judiciária no Brasil colônia estava assim disposta, por ordem decrescente de importância: Ouvidor, Juiz Ordinário ou da Terra, Juiz de Vintena, Almotacéis, Juiz de Fora e Juiz de Órfãos. O órgão máximo era a Casa de Suplicação, que ficava em Lisboa; depois vinham o Desembargo do Paço, a Casa do Porto, a Mesa de Consciência e Ordens, o Conselho Ultramarino, a Junta de Comércio, o Conselho do Almirantado, o Tribunal da Junta dos Três Estados, o Régio Tribunal ou Fazenda e o Tribunal do Santo Ofício.

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